Prefácio:
Estamos apresententando temas trazidos das palestras acontecidas na última Jornada de Anestesiologia do Estado do Rio de Janeiro, ampliando, desta forma, o alcance da informação, para atingir aqueles que não puderam comparecer.
A transformação dessas palestras e discussões em informação tem ainda a vantagem de permitir o acesso continuado aos conhecimentos alí transmitidos e, principalmente, permitirá lembrar o toque pessoal de cada um dos expositores.
Esperamos que este seja um produto de grande utilidade.
Felicidades
Equipe:WellBeing/BemEstar*.
Técnicas Anestésicas e Desfecho em Cirurgia Vascular: Anestesia Regional
Introdução
Poucos pacientes oferecem tantos desafios para o anestesiologista quanto o paciente submetido à cirurgia vascular, especialmente a cirurgia arterial. Este fato ocorre pela associação de uma cirurgia de grande porte, como é o caso da cirurgia para correção de um aneurisma de aorta abdominal, com um paciente com uma alta incidência de doenças associadas. Esse paciente normalmente apresenta uma história de arterioesclerose, hipertensão arterial sistêmica, tabagismo, doença da artéria coronariana (DAC) e diabetes mellitus. Uma combinação entre todas essas morbidades está frequentemente presente e o prognóstico do paciente diretamente ligado à sua gravidade. A incidência da DAC pode atingir 50-70% dos pacientes submetidos à cirurgia arterial, com isso, o índice de infarto agudo do miocárdio (IAM) pode alcançar 34%, com uma mortalidade de até 40%.
Anéstesia Geral x Anestesia Regional
Em uma especialidade com uma incidência tão alta de complicações cardiovasculares, até que ponto a escolha da técnica anestésica pode influenciar o prognóstico? De uma forma geral, as cirurgias arteriais sempre foram um motivo de debate entre adeptos das anestesias geral ou regional, com vários argumentos de cada lado, sendo que o principal fator complicador da anestesia regional, especificamente raquianestesia ou peridural, é a necessidade de heparinização peroperatória, com consequente risco de ematoma espinhal.
Vantagens da Anestesia Regional
O uso da anestesia peridural propicia benefícios fisiológicos e pode atenuar as consequências fisiopatológicas que se seguem à cirurgia. A anestesia peridural torácica, alcançando os segmentos(T1-T4), melhora a disfunção ventricular induzida pela isquemia, reduz os sinais eletrocardiográficos, ecocardiográficos e angiográficos da insuficiência coronariana e diminui a insidência de arritmias.
Os anestésicos locais têm a capacidade de bloquear os sinais aferentes e eferentes que entram e saem da medula espinhal, diminuindo, dessa forma, a resposta endocrinometabólica ao stress cirúrgico.
Parker SD¹ e colscompararam 60 pacientes submetidos à cirurgia de revascularização de membros inferiores, divididos em dois grupos: anestesia geral associada à analgesia peridural (30 pacientes) e anestesia geral associada à analgesia venosa (30 pacientes), e obtiveram menores valores de catecolaminas plasmáticas e cortisol urinário peroperatório no grupo submetido à analgesia peridural. Com isso, os pesquisadores perceberam uma menor incidência de hipertensão arterial sistêmica neste grupo e concluíram que esse efeito benéfico se dava pela atenuação da atividade do sistema nervoso simpático pelo bloqueio epidura.
Cirurgia e Hipercoagulabilidade
As cirurgias de grande porte são associadas a um estado de hipercoagulabilidade que persiste no período posoperatório. O aumento, na síntese de fibrinogênio, da atividade plaquetária e a diminuição na síntese de antitrombina III, consequentes à resposta endocrinometabólica ao trauma, seríam as principais causas dessa hipercoagulabilidade. A incidência de complicações tromboembólicas é menor em pacientes operados sob anestesia peridural, quando comparados à anestesia geral. Em uma época quando a profilaxia para trombose venosa profunda não era uma rotina,Sorenson e cols evidenciaram uma diminuição de 31% na incidência de trombose venosa profunda em pacientes submetidos à artroplastia total de quadril sob anestesia peridural, quando comparado à anestesia geral. Tuman J.K. e cols² compararam dois grupos de 40 pacientes submetidos a cirurgia vascular de grande e analisaram o traomboelastograma destes. A tendência à hipercoagulabilidades foi menor no grupo onde a anestesia epidural foi associada à anestesia geral, em comparação com o grupo de somente anestesia geral. Outros efeitos benéficos, como diminuição nas complicações infecciosas e cardiovasculares, e também no tempo de internação foram visto no grupo de anestesia associada (geral epidural). Um fato interessante que foi visto nesse estudo foi à comparação do tromboelastograma dos pacientes que seriam operados com um grupo-controle de voluntários, e a verificação que os pacientes vasculares já apresentavam uma tendêcia à hipercoagulabilidade antes mesmo de serem operados.
Trombose do Enxerto
A tendência à hipercoagulabilidade pode, juntamente com a ativação do sistema nervoso simpático, ser responsável pela alta incidência de infarto agudo do miocárdio no posoperatório das cirurgias arteriais. Porém, essa tendência também pode ser uma das causas, juntamente com a má técnica cirúrgica, da trombose do enxerto vascular, complicação que, além de significar um fracasso cirúrgico, também leva à necessidade de reoperação que, por sí só, aumenta a morbimortalidade.
Christopherson e cols³ randomizaram 100 pacientes submetidos à revascularização de membros inferiores em um grupo (50 pacientes) sob anestesia geral e outro (50 pacientes) sob anestesia peridural e obtiveram uma menor necessidade de reoperação por trombose de enxerto no grupo do bloqueio epidural. Parker SD e cols¹, quando obtiveram menores valores de catecolaminas e cortisol no grupo de anestesia geral associada à peridural também observaram uma menor incidência de trombose de enxerto neste grupo, fato que, segundo os autores da pesquisa, pode ilustrar a associação entre situação de stress e hipercoagulabilidade.
CONTINUA...